Moradia e Dignidade
por Noemi da Aparecida Lemes
Meu primeiro olhar sobre morar com dignidade foi aos 8 anos, quando fui visitar minha avó materna, que morava em área de risco, próximo de um lajeado.
Chegando lá, meus pais pediam para que eu cuidasse para não pisar no esgoto fétido que corria a céu aberto, entre as humildes casas que lá existiam, e onde as crianças brincavam, descalças e sem perspectivas.
Na volta para casa, de dentro do carro de meu pai, eu observava, com a pureza de uma criança, como havia terra bonita, desocupada às margens da rodovia e pensava: Por que será que a vovó não constrói a casa dela nesses terrenos tão lindos?
O tempo passou e depois de alguns empregos (trabalho desde os 9 anos de idade), como babá, doméstica, operária, almoxarife e auxiliar de escritório.
Aos 23 anos passei em um concurso público para trabalhar justamente na maior Empresa Pública, Agente Financeiro de fomento a construção habitacional no Brasil: A Caixa Econômica Federal.
E entre os diversos colegas que também ingressaram naquele dia, eu fui escolhida para trabalhar no setor de Habitação, de onde nunca mais me desvinculei.
Tempo depois, pela minha experiência na CAIXA, fui convidada a assumir o cargo de Diretora de Habitação do município, período em que os laços com a habitação de interesse social, me despertaram para a importância do trabalho social que era executado nas novas assentamento criados pelo Poder Público.
Nos conjuntos habitacionais e loteamentos para famílias em situação de vulnerabilidade social, vindas de diversos bairros, moradores de áreas irregulares, de preservação ambiental e risco, vítimas de despejos, e em algumas comunidades já existentes, era urgente e fundamental a presença do Poder Público em projetos sociais e parcerias para enfrentar os problemas das mais diversas ordens aliados à falta de moradia adequada.
Era latente a percepção de que a casa só não resolveria os problemas. Para morar com dignidade era necessária a intervenção, através de projetos sociais que pudessem transformar o conjunto de casas em uma comunidade e cada casa em um lar.
Me formei em Serviço Social.
De volta para a CAIXA, nos diversos cargos que ocupei, Habitação de Interesse Social sempre foi o carro-chefe.
Em 2009, no Governo de Luiz Inácio Lula da Silva, foi criado o Programa Minha Casa Minha Vida, (Lei 11.977 de 7 de julho de 2009) com objetivo de enfrentar a atual crise econômica mundial, através de um projeto audacioso de construir 2 milhões novas unidades habitacionais, em um ano, gerando milhares de empregos, gerando renda e movimentando a economia do País.
Também foi criado pela primeira vez na história do Brasil, o primeiro Programa de Habitação Popular, específico para famílias da campo (agricultores familiares, quilombolas, indígenas, pescadores, comunidades ribeirinhas e povos tradicionais), até então, os programas de habitação para famílias do campo estavam vinculadas às mesmas regras dos projetos de habitação urbana.
E eu tive o privilégio de em 2011, assumir a Superintendência de Habitação Rural- SUHAR, na CAIXA.
Um novo e extraordinário desafio se apresentava. Construir casas, em todo o Brasil, respeitando as especificidades de cada região e a cultura de cada povo.
Para esse desafio, parcerias da CAIXA com Movimentos Sociais e Poder Público Federal e municipal foram fundamentais, para atuar no resgate da cidadania de muitas famílias, focado na garantia constitucional do direito à moradia (Constituição Federal de 1988):
“Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.
O Projeto Social, acompanhado de perto pelos Assistentes de Projetos Sociais da CAIXA, comprometidos e apaixonados por seu propósito e missão, fizeram e fazem a diferença.
Nos projetos, ações de organização social, empoderamento da mulher (nesse tema a participação da mulher nas decisões sobre a gestão da propriedade, violência doméstica, saúde da mulher, etc.), meio ambiente sustentável (produção de alimentos sem agrotóxicos, cuidados com a água, cisternas), sindicalização, sistema de cooperativas, entre outros, são fomentados em parceria com o Poder Público, propiciando acesso a outras políticas públicas nas comunidades, sendo que algumas, pela primeira vez receberam recursos públicos do Governo Federal.
O Programa Minha Casa Minha Vida Rural – PNHR beneficiou mais de 200 mil famílias entre 2009 a 2016.
O Programa que estava paralisado, volta novamente, recriado pelo atual Governo Federal e vai exigir de nós, Assistentes de Projetos Sociais da CAIXA todo nosso profissionalismo e comprometimento para que milhares de famílias possam adquirir o direito a morar com dignidade em todos os cantos desse Brasil, majestoso e diverso.
Minha avó morreu sem nunca ter alcançado o direito a uma casa digna, mas sei que onde estiver sua alma, se orgulha de meu trabalho de poder contribuir para que muitas famílias conquistem cidadania através do direito de morar com dignidade.
Noemi da Aparecida Lemes é Assistente de Projetos Sociais em Chapecó – SC e Ex-Superintendente de Habitação Rural na CAIXA.
Ótimo artigo! Parabéns!